quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

To the valley below.

Ele acordou, olhou para o lado e viu apenas o travesseiro. Estendeu o braço para pegar sua camisa na cadeira, mas não mais se encontrava lá. E da brecha da porta entreaberta, ouviu o zumbir da chaleira com água fervente. Ao sair do quarto, deparou-se com ela, vestindo sua camisa xadrez de flanela e aquela calcinha azul que chamou sua atenção desde o momento em que a viu vestindo-a. Parou para observá-la passando o café e sentiu o aroma do grão recém moído.

- Te acordei? - Ela perguntou sem tirar os olhos daquela coisa estranha na qual ela fazia o melhor café que já tinha tomado na vida. Talvez não fosse o melhor... Mas era o que ela tinha feito.

- Não. 

- É que eu não estava encontrando a chaleira, daí fiquei procurando e acho que estava fazendo barulho, mas acabou que...

Ele a beijou.

- ... encontrei. - Ela segurou o sorriso. - Seu café. 

- Obrigado, querida. - Tomou um gole e beijou-a. Aquele beijo quente. Doce. - Está muito bom.

Ela sorriu. - 'brigada. Podemos voltar a ficar embaixo do edredom agora?

Ele riu. - Claro.

- Vendo desenho animado? E comendo brownie?

- Podemos.

E debaixo do edredom, ele confortou os pés nas pernas dela, quentes como aquele café na xícara.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Quando ele me beija, é natal o tempo todo.

Já estava na rua perto de casa quando viu o céu negro do fim da estrada.

“Vixe, vai cair pé d’água.” - Pensou.

Apressou o passo e virou a esquina quando o vento soprou e trouxe o som de uma vitrola a tocar uma música familiar. Sorriu e parou para vê-la pela janela da cozinha do apartamento, de camisa e calcinha (já tinha avisado a ela que da rua dava pra ver o apartamento, mas ela teimava em não acreditar), dançando com Woody Hermann, o músico de jazz que ela mais gostava de ouvir quando estava cozinhando. Ela havia dito que chegaria cedo do trabalho e que hoje faria o jantar.

Desceu a ladeira, entrou no prédio e lentamente, colocou as chaves no trinco da porta. O som do piano vindo das caixas da vitrola aumentou. Posicionou-se no vão da porta da cozinha, enquanto ela ainda não tinha sentido a presença dele. Ela continuou dançando e cortando as cebolas, tomates e calabresa. Foi quando ele riu. Ela se virou e riu:

“Está aí há quanto tempo? Nem pra vir me ajudar a cortar as coisas... Só fica aí olhando minha bunda e as minhas pernas.”

“São lindas, fazer o quê?”

Ela lavou as mãos. Deixou a faca e as coisas no balcão. Foi quando Frances Wayne começou a cantar Happiness is a Thing Called Joe.

“Dança comigo?”

“Sempre.”


E enquanto o pé d’água caia lá fora, a felicidade dançava naquela cozinha apertada.

P.S. Clica no nome da música para ouvir no youtube :)

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Ristretto.

Ela sentou na área externa e pediu por um espresso. Não, um ristretto. Ela não estava bem humorada. Ela precisava de um sabor forte na boca. Quando a xícara quente apareceu na mesa, ela pegou o cigarro e viu a fumaça dançar na frente de seus olhos. Café e cigarros. Isso era tudo o que ela precisava. 

- Oi.

Deus. Tudo o que ela queria era ficar um pouco sozinha com seu café e seu cigarro. Ela olhou para cima e o viu. 

- Oi.
- Sozinha?
-Sim.
- Mal humorada?
- Absolutamente.
- Você não quer companhia, né?
- Hm. Bem. Eu não queria. Mas já que você já está aqui, tome uma xícara de café comigo, pode ser?
- Um cappuccino, por favor? - Ele pediu. - Então, o que você está lendo?
- Lygia Fagundes Telles.
- É bom?
- Sim. Olha. Você não quer ir para outro lugar?
- Outro lugar?
- É. Um lugar mais quieto, onde a gente poderia talvez... sei lá... transar. E depois eu poderia nos fazer café e podíamos fumar e falar besteira.
- Ok, eu tenho um lugar.

Café, cigarros e sexo. ISSO era tudo que ela precisava.

sábado, 19 de outubro de 2013

- Continua.

A chuva caia lá fora.
- Continua.
As lágrimas caindo torrencialmente no travesseiro.
Os olhares se cruzaram, profundamente, e continuaram por segundos que pareceram séculos.
Secou-lhes os rios do rosto.
Os raios e trovões cantavam e iluminavam o lençol na janela.
- Continua.



Aquele amor sempre haveria de continuar.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Glup.

A cerveja entrou gelada, rasgando em sua garganta.

- Desisto.
- De quê?
- De tudo.
- Hein?
- É. Tô de saco cheio.
- De quê, menina de deus?
- De tudo, cacete. Quero uma pausa.
- Tivemos um mês de férias.
- E já tivemos um mês de aula.
- Já já acaba.
- O quê?
- A faculdade.
- Mas é disso que eu tenho medo.
- Também.
- Que acabe logo essa TPM então. É a alegria mais próxima que posso ter.
- Calma, fiazinha. Acabemos nossa cervejinha tranquilas ao som de... Como é o nome mesmo?
- Led Zeppelin, vei! E acabar essa cervejinha não é uma alegria. Porque assim que acabar, a vida aparece.
- Tu tá precisando de uma boa fudida.
- Estou. 
- Mas já está com os dias contados.
- Espero.
- Está. Relaxe. Relaxe que já já você goza.
- Obrigada, fiazinha.
- Pelo quê?
- Pelas palavras de amizade.
- De nada. Eu sei que você me diria o mesmo. Ou pior. 

"A minute seems like a lifetime [...] when I feel this way" cantava Robert Plant, enquanto que a cerveja cantava  "glup" em suas gargantas.

sábado, 21 de setembro de 2013

Trânsito.

Um dos grandes males do mundo moderno é o trânsito. Uma pesquisa feita pela USP aponta que há uma perda diária de cerca de 11 milhões de reais com o tempo gasto no trânsito, além do combustível, claro. Nem vamos começar a falar dos problemas de saúde que dizem que o trânsito pode trazer às pessoas. Vai de estresse até disfunção erétil (pois é). Sim, o trânsito é uma coisa chata. Que nos tira a paciência, que nos atrasa, que segue uma proporcionalidade murphyana: quanto menos tempo você tem para chegar em um lugar, maior será o tráfego de carros. Mas devo admitir que de vez em quando, o trânsito, aquele quilométrico, pode ser uma coisa boa. HEIN? É. Às vezes a gente está tão bem consigo mesmo, tão feliz, que cantar junto com a Karina Buhr no volante, sozinha, traz uma tranquilidade imensa. Mesmo com os carros buzinando do lado. Porque você está tão bem que as pessoas estressadas ao lado não influenciam em nada na felicidade sem razão do coração. Ou mesmo quando você está triste. O trânsito e a música aleatória que o rádio começou a tocar podem responder perguntas que você não estava conseguindo resolver há dias, há semanas. Chorar no volante? Sim, pode, qual o problema? Devo dizer: o carro e a fila sem fim de carros a sua frente podem ser até melhores que uma consulta no psicólogo. Pode parecer estranho. Tenho amigos que simplesmente sentem pavor de entrar no carro, dirigir e enfrentar o trânsito. Mas poxa. Ele está lá. E a não ser que você tenha um helicóptero para se locomover, utilize o tempo 'perdido' com você. Pense na vida, cante junto com a Karina Buhr, ouça um nerdcast, planeje o que vai fazer quando chegar em casa: dormir ou assistir aquele filme, aprenda uma língua estrangeira... Sei lá. São tantas coisas que se pode fazer ao esperar seu carro sair do canto que eu me perco. 

E escrevendo esse texto, deu uma vontade de pegar o carro e sair por aí. Parar na Subway, comprar um sanduíche e enfrentar o trânsito na volta pra casa ouvindo Led Zeppelin nas alturas. Com licença, gente. Vou ali sair comigo.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Hoje eu quero sair só.

Não sou fã do Lenine. Às vezes, ouço uma música ou outra desse pernambucano lindo. E hoje, acordei com essa música na cabeça e decidi: Hoje eu quero sair só. Muita gente acha deprimente sair só, como se pra ser feliz é necessário, imprescindível a presença de outra pessoa. Pois eu digo que não. Tá certo, é bom ter uma companhia de vez em quando. Ir no bar com os amigos, ir na casa dos primos e ver filme. Mas devo dizer que sair sozinho é tão importante quanto tomar aquela cerveja com a galera da faculdade na sexta feira. Sim. Saber que você é uma companhia tão boa que assistir aquele filme nacional com você mesmo é um ótimo programa de meio de semana, quando o shopping não está tão cheio e você acha com facilidade um canto na praça de alimentação para tomar café e ler os jornais. A sensação de independência é incrível. Não depender das outras pessoas para decidir que filme assistir ou que horário vai pegar. Se pegar rindo sozinho lendo as leseiras no celular. Ser paquerada na escada rolante enquanto você está descendo e o cara está subindo. Ou ser cantada pelo moço do cinema que viu sua carteira de motorista e disse: "Poxa, mudou mesmo o visual em relação a foto. Tá bem mais bonita agora". Se pegar cantando sozinha enquanto está escolhendo que doce comprar para acompanhar o filme. Ver aquele professor coroa gatão da faculdade com aquela camisa xadrez e rir sozinha se achando idiota. Sair do cinema e ainda tomar um espresso com grão mineiro...

Jobim disse que é impossível ser feliz sozinho. Rapaz, nem sempre, viu? Nem sempre...

domingo, 25 de agosto de 2013

Ande de ônibus.

Frase que encontrei no mesmo dia do leitor de Kerouac.
Sempre fui usuária do transporte público, popularmente conhecido como ônibus. Muitas pessoas reclamam. Sim, o serviço não é bom. É péssimo para falar a verdade. Tem gente mal educada, tem funkeiro com som alto, tem brigas... Mas de vez em quando nos deparamos com situações bem interessantes. Essa semana, um senhor sentou ao meu lado. Observei que ele sempre estava olhando para o livro que estava lendo 'O homem e seus símbolos' de Carl Jung. Daí que ele iniciou uma conversa comigo. Disse que era músico e que gostava de ler. Disse que gostava de encontrar jovens como eu (que liam) para trocar conhecimento. Perguntou se eu sabia o que meu nome significava e logo respondi "Morena, vem do italiano" e ele respondeu "Engraçado. Você é branca e tem uma feição aristocrática". Não entendi a 'feição aristocrática'. Estava com camisa estilo indiana, all star, jeans e óculos escuros. Apenas respondi "Branca? Me considero morena, parda". Disse que não tinha ensino superior, pois foi expulso da Universidade Federal onde cursava Agronomia por seguir o Marxismo. Disse não ter muito dinheiro, que tinha o necessário para sobreviver, mas que era feliz. Falou sobre o movimento dos Beatnik com Jack Kerouac e Allen Ginsberg e me revelou:

"É incrível como os Beatniks defendem a liberdade. E aí eu observei: Como eu era autoritário seguindo o Marxismo".

Alguns minutos depois, perguntei se hoje, depois de ter lido Kerouac, ele ainda seguia o Marxismo. Ele enrolou, enrolou, enrolou e não respondeu minha pergunta. Chegou o meu ponto e ao me despedir desejou que eu tivesse sucesso na minha carreira de jurista. Respondi "Espero" e dei um sorriso.

Pequenos encontros como esse fazem uma viagem de ônibus bem interessante. Ao voltar para casa, vi uma mulher conversar com a cobradora como se se conhecessem há muito tempo. Ao chegar perto do ponto em que ia descer, vi que se apresentaram e trocaram telefone. Aquela era a primeira conversa entre as duas. Engraçado como alguns minutos (ou horas) em um ônibus pode alegrar teu dia, enriquecer teu conhecimento ou mesmo te oferecer um amigo.


Então, fica aqui minha dica: Ande mais de ônibus. Além de sustentável, pode ser uma boa terapia ou uma boa aventura.

P.S. Tem um textinho que rola na internet há tempos bem interessante (e verdadeiro) sobre andar de ônibus.  

domingo, 28 de julho de 2013

As horas.

Saiu enrolada no lençol e sentou no banco gélido. Estava sozinha. Sentiu-se arrepiar e se apertou ainda mais no cobertor. Acendeu o cigarro e viu o sol ainda abaixo da linha. Tinha perdido o sono e decidiu sentir o frio, o orvalho da madrugada. A noite estava indo embora, sabia. Mas por que sempre sentiria o frio da escuridão, mesmo quando o sol estivesse acima do horizonte? Por que sempre seria assim? Por que nunca se deixaria iluminar por completo? Por que teria sempre o orvalho, o sereno e o céu escuro, o breu dentro de si? Não sabia. Nunca saberia. E nem mesmo tentaria entender.

Aquilo era parte dela. Assim como o amanhecer e o entardecer fazem parte do dia. A ambiguidade da escuridão e da claridade.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Me beba.

Me traga a garrafa de vinho, meu amor. 
Me traga a garrafa de vinho e mais duas taças.
Uma para mim, outra para você.
Porque essa noite eu quero me entregar.
Me entregar por completo.
Me traga a garrafa de vinho. 
Entre os goles e meus lábios molhados, 
sinta meus beijos úmidos.
Sinta minhas unhas arranharem suas costas nuas,
minha voz embargada pela bebida sussurrar no pé do seu ouvido.
Ouça minhas besteiras e me leve a cama, me dispa e beba de mim.
Beba logo. Beba tudo. Beba devagar. Com moderação, mas com selvageria.
Me dê essa paixão vadia,
acenda esse fogo que vai se apagar
assim que a garrafa acabar e o dia surgir no horizonte.

domingo, 9 de junho de 2013

Ótimo, meu amor.

Colocou a calcinha e vestiu a camisa dele que estava na cadeira. Pegou o maço de cigarros e tirou da cafeteira a xícara que já esperava por ela. Sentou-se no chão da varanda, acendeu o cigarro e viu os desenhos de fumaça dançarem a sua frente. Ele se levantou da cama e se posicionou na porta:
- Você me ama?
Ela parou. Tomou um gole de café. Tragou o cigarro.
- Claro que não, querido.
Ele sorriu. Roubou o cigarro. Roubou-lhe um beijo. E disse:
- Ótimo, meu amor.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

E que se foda o mundo.

Deitou-se na cama e sentiu o lençol frio tocar-lhe o corpo nu. Precisava ficar sozinha. Sozinha com a Sarah na vitrola e sua grande xícara de café. Porque café é a bebida perfeita. Esteja você triste ou feliz. Depois de meses sentindo apenas o amargor do café, poderia agora bebê-lo sem açúcar e achar a bebida mais doce de todas. Mesmo com as dúvidas que pipocam sempre na sua frente, ela agora poderia dizer que tinha voltado aos trilhos. Estava sozinha. Sim, estava sozinha. Mas a solidão que teve ao não-estar sozinha tinha sumido. Ela agora estava segura de si mesma que poderia ficar sozinha por tempo indeterminado. Mesmo não tendo a confiança que gostaria de ter, sentia-se mais segura com seu corpo e com sua mente. Era uma menina... não. Já era uma mulher. Poxa, já é uma mulher. Uma mulher que não se sente como as outras. É uma mulher que não se importa com o mundo. E isso não é egoísmo, entenda. Ela só quer aproveitar do jeito que acha correto, do jeito que quer que seja, do jeito em que se sente bem consigo e sua alma louca. Sem se importar com o que possam dizer dela. É do tipo que sairia de calcinha e sutiã na rua. Sem vergonha, pois é o jeito que se sente confortável. Gosta de beber, de falar palavrão, de fumar quando está se sentindo bem ou quando quer relaxar. Não é do tipo academia ou maquiagem. Tem preguiça de manter a rotina de base e pó compacto. Prefere os olhos mais escuros.

O que importa é que está bem consigo mesma do jeito que é e sempre foi.


E que se foda o mundo. 

sábado, 13 de abril de 2013

Jogo da Vida.

Às vezes eu acho que as coisas seriam bem mais fáceis se eu me matasse. Isso não é uma carta suicida. Não. Eu não vou me matar. Mas é que de vez em quando, eu tenho esperança que a vida seja que nem aquelas de videogames. Eu morro e depois volto ao começo. Ou volta a uma parte segura. Mas a vida, como vocês bem sabem, caros amigos, não é assim. A vida de verdade. De carne e osso. Não vem com manual de instrução como aquele Jogo da Vida. Ou com uma versão demo (não de demônio, a forma demo, demonstração). Acontece que em alguns momentos, eu queria uma dica. Uma dica que desse em algo bom. Uma carta de sorte. Porque às vezes, parece que só vem carta de revés. Armadilha após armadilha. É quase como aquele jogo, Limbo. Parece que tudo está nas trevas e você não consegue ver onde pisa e o que te espera. Ou Campo Minado, quando você acha que encontrou um ponto tranquilo pra clicar e daí BAAAAAAAAM. Fico pensando: seria legal perder a vida de vez em quando, ganhar outra, começar. Ou melhor, recomeçar de um ponto firme; comer um cogumelo e melhorar de vida, ficar mais forte, ou até mesmo parar quando se sentir cansado. Mas não há como. Não há pausa, mas apenas o certo game over. O que nos resta então, é jogar a Paciência.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Mas eu não sou apaixonada por você, cara.

- Posso falar com você? - Baixou a voz - Em particular?
Ela estranhou, mas afirmou com a cabeça. Ao se afastarem das que pessoas que conversavam alto na área de lazer do prédio, ela decidiu perguntar logo.
- Aconteceu alguma coisa?
- Não, nada. É só que eu tenho que te falar uma coisa.
- Ahm, ok. Então fala.
- Como eu vou falar isso?
Ela o encarou sem entender o que porra estava acontecendo.
- Bem - ele começou - é que eu soube que você tem sentimentos por mim e eu tenho que te avisar - ela tentou interrompê-lo, mas ele continuou - Não precisa ficar com vergonha. Eu sei, isso acontece, a pessoa se apaixonar pelo chefe, mas é complicado isso. Sinto muito, mas não dá, não quero te magoar. - Ele sorriu.
- Ahm.
- Você é uma garota muito legal, inteligente, bonita, se eu pudesse com certeza te chamaria para sair. Mas...
- Mas eu não sou, nem estou apaixonada por você, cara. 
- Quê? - O sorriso sumiu de seus lábios. Na verdade, continuou, mas para disfarçar a surpresa.
- Eu não sei quem te falou tudo isso, mas eu não sinto isso por você. O que eu sinto por você é uma coisa completamente diferente de amor. Eu só sinto tesão por você. Tara. Sabe?
- Quê?
- Ahm. É... Desculpa ser tão direta assim, mas é a verdade. Como você mesmo diz, sou kantiana né?
- É, claro. Mas, ahm.
- Cara, eu só penso em transar com você. Só isso. Nada mais. Não se preocupe que eu não te amo, ok?
- Ok.
- Não era isso que você pensava ouvir de mim né? Mas poxa, cara. Você preenche todos os requisitos. Ou quase todos: é mais velho, tem barba, é meio galinha, é gostoso, é inteligente, é legal... Já tem até filho. Perfeito pra ser o tipo buddy call.
- Estou me sentindo meio usado, mas tudo bem.
- Eu nem te usei ainda, cara, relaxa. Vixe.
- Por que eu ter um filho já ajuda?
- Porque, oras. Não é daqueles caras que fica conversando sobre ter filhos futuramente, já tem um, pra quê mais?
- Hm. E como assim eu sou galinha? E como isso te ajuda?
- Cara, vai negar que tu é galinha?
Ele deu de ombros. Ela continuou.
- E ainda, repito, só quero sexo. Fuck. Quem sabe cinema às vezes. Ou jantar. Mas qualquer coisa que dê na cama.
- Estou me sentindo usado.
- Cara, relaxa. Você é como o irmão bastardo do príncipe encantado.
- Hein?
- Você é o irmão mais bonito, mais gostoso, mais pegador, que come todas as princesas do continente, mas não é o cara pra casar, sabe? Daí a princesa transa contigo, mas casa com o príncipe, porque ele sim é um cara pra se casar, mais responsável e que come bem pra vida de casado e que vai amar a princesa como uma verdadeira rainha.
- Então quer dizer que eu não sou o príncipe encantado?
- Cara, que isso... Você pode ser pra alguém, mas eu não quero nada disso com você. Quero seu lado Lancelot, não Arthur.
- Pois procure outro, porque eu não sou Lancelot ou um boneco pra você usar a hora que quer. - E saiu indignado, marchando prédio acima.
- Danosse. Além de filho bastardo é viado.

domingo, 17 de março de 2013

Cigarros e café.

- Quer um cigarro?
- Você fuma?
- Não. Só de vez em quando.
- Aceito.
- Você fuma?
- Só de vez em quando.
- O café está pronto. Aqui.
- Obrigada.
- Açúcar ou adoçante?
- Nenhum dos dois.
- Você toma puro?
- Quero provar o grão.
- Hm.... É bom?
- Heh. Para um café de cápsula... Prefiro o café coado mesmo.
- Também. Da próxima vez você prepara.
- Haverá uma próxima?
- Por que não?
- Não sei.
- Você não gostou?
- Não é isso.
- E é o quê?
- Não sei.
- Foi estranho?
- Não. Foi bom. É só que... Nada. Foi muito bom pra falar a verdade. Próxima vez eu faço o café.

terça-feira, 12 de março de 2013

Antes de dormir.

Sempre achei que o momento antes de ir dormir fosse o mais difícil. Porque mesmo que você esteja com muito sono, com o corpo demandando descanso, a sua mente pode estar funcionando a mil. Pode estar andando em pensamentos sem parar, como um carrossel ou mesmo como um tubarão. Porque você sabe né? Tubarões não param de nadar senão afundam. Pois é exatamente como a mente antes de dormir. Você tem até um livro de cabeceira, mas o que você queria mesmo era pregar os olhos e se entregar àquele sonho com o Thorin do Hobbit. Ou que está preso nas Lojas Americanas comendo todos os doces e brincando com todas aquelas imagens de ação. Mas não.

Daí você lembra a quantidade de coisas que tem que fazer no dia seguinte. E no outro. E no outro. E no outro.

E no outro.

E você perde o sono de vez para dar lugar ao desespero. Por que você está deitada na cama, enroladinha no lençol enquanto há quatro provas batendo fortemente em sua porta? Um projeto a ser escrito? Textos a serem lidos e fichados? 

É tanta coisa a se fazer que só de pensar, você cansa. 

Cansa tanto que o sono chegou. E o sono chegou com tanta força que a coragem que você tinha de guardar o caderno que você está escrevendo essa nota foi embora. 

Fica no chão mesmo, caderno. Amanhã eu te guardo.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

My kind of trouble is Fitzgerald on a vinyl.


- Comprei um disco da Ella Fitzgerald... Perfeito. Todas as vezes que escuto, penso que sou uma personagem de um filme que se passa em Nova Iorque. E que estou prestes a me apaixonar e ter o emprego dos meus sonhos. E que tudo vai dar certo.
- Você quer dizer disco de vinil ou CD?
- Disco de vinil.
- Sério, não entendo ainda essa história de que disco de vinil é melhor que cd. Se o disco é melhor que o cd, por que ele parou de ser fabricado?
- Ele não parou de ser fabricado. Ele só diminuiu a produção. Junto com a produção de música de qualidade.
- Não não... Não entendo isso não. É você e minha irmã que ficam falando disso.
- Sua irmã deve ser uma pessoa bem legal. Gostaria de conhecê-la. Enfim, cara. Já até te mandei um link explicando o porquê da melhor qualidade. E não é só isso, a questão da qualidade sabe? É o ter discos. Ter aquelas prateleiras cheias; tirar o vinil da capa com cuidado, ver a agulha cantando Fitzgerald, Vaughan... Jazz numa vitrola é uma coisa totalmente diferente.
- Isso é coisa hipster, hipster.
- Bem, se se sentir bem tomando um bom café, ouvindo jazz na vitrola, com uma boa companhia é ser hipster... Bem... Sou hipster com muito prazer desde 2006.
Ele sorriu. – Como diz a Fitzgerald, my kind of trouble is you.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Só.


As pessoas tem uma ideia errada do querer ficar sozinho, de solidão, de ficar mais afastado das outras pessoas. Às vezes, eu mesma não entendo porque alguém quer ficar recluso, junto com seus pensamentos. Daí surge a necessidade em mim de querer ficar assim e passo a entender que todo esse sentimento de solidão é quase como um remédio para certas fases da nossa vida.

Claro que é bom dividir um tempo com os amigos. Principalmente aqueles que conhecem seu coração mais do que você e que um simples abraço deles já acalma a alma tormentosa. Mas é que quando a vida está em fase de mudança e você sente isso, é quase como a mudança da borboleta. É melhor ficar no casulo, num casulo com livros, uma xícara de café, algumas fitas (falei fita para entrar no espírito de As Vantagens de Ser Invisível), uma cama e uma TV para assistir filmes.

Nesses dias, eu vi alguns amigos e foi até bom. Bom demais. Mas ficar sozinha, pelo menos nessas últimas semanas, tem respondido algumas perguntas que estavam na minha cabeça há alguns meses. Talvez a minha solidão tenha esse poder, de me fazer solucionar certos cálculos da vida.

sábado, 12 de janeiro de 2013

"... recursos fadados ao fracasso"

Todo começo de ano é aquela coisa: vou fazer minha lista de resoluções, estabelecer metas... Esse vai ser um bom ano. Dos 365 dias que formaram 2012, posso dar a probabilidade que apenas 80 foram bons. O resto foi aquele tipo de dia que você acorda, vive e dorme. Assim, eu esperava que eu começasse o ano de 2013 com uma esperança. Uma esperançazinha. Nem precisava ser uma vela de 7 dias. Poderia ser aquelas que servem de decoração. Bem pequenininhas. Mas sabem aquele ditado, que Deus jogou os dados errados? Bem, posso dizer que meus dados estão viciados e desde 1 de janeiro as coisas estão soltas, sem rumo e nada bem. E parece que hoje, 12 de janeiro, um sábado, as coisas ruins se concentraram. Em apenas 2 horas eu quebrei o farol do carro, quase atolei, comecei a ter aula de processo civil (uma das disciplinas mais complicadas e exaustivas da grade do curso de Direito) num sábado na Universidade Federal que é praticamente em outro município... 

E o pior de tudo: eu não vejo a luz no fim do túnel. "I started lookin' for a warning sign". A vida deveria vir com um kit de emergência nesses momentos. O que fazer quando você está cansado das pessoas? Ou da faculdade que você escolheu? O que fazer quando você percebe que a determinação que você teve até os seus 20 anos de idade não te levou para o lugar que você pensava que seria o teu lugar ideal? E quando você começa a se frustrar e se cansar de tudo? Vida, o que eu faço? Eu li que os jovens de 20 anos estão sofrendo crises existenciais, porque é fase universitária, da busca de emprego... Quer dizer que eu sou um desses jovens? É apenas uma fase, alguns dias, alguns anos... Uma década? Vida, me diz se vai durar muito porque o negoço tá foda.

Daí que eu tenho vontade de me mudar. Deixar a faculdade, fazer uma coisa que eu gosto, ir para o lugar mais distante que eu possa ir. Mas como fazer isso? Se eu não tenho emprego, se eu não tenho dinheiro? Como deixar uma faculdade que já estou há 2 anos e meio e simplesmente sumir? Me apagar do mapa do agora?


E assim, volto pra estaca inicial. Talvez eu não tenha tanta coragem assim. Talvez eu seja como os recursos da aula de hoje: simplesmente fadados ao fracasso.


Ouvindo: The Scientist - Coldplay.